segunda-feira, 3 de março de 2014

Especial: três primeiros capítulos de "A Escolha"

Bom como essa semana chegou meu livro "Contos da Seleção", resolvi fazer um post com os três primeiros capítulos de "A Escolha", terceiro e último livro da série A Seleção, confira abaixo a capa oficial em português e os três primeiros capítulos do livro. 


A Escolha

Capítulo 1

NAQUELE DIA ESTÁVAMOS NO GRANDE SALÃO aturando mais uma aula de etiqueta quando os tijolos começaram a voar através da janela. Elise se jogou no chão imediatamente e começou a rastejar em direção à porta lateral, choramingando. Celeste soltou um grito agudo e disparou para o fundodo salão, escapando por pouco de uma chuva de estilhaços de vidro. Kriss me puxou pelo braço, e começamos a correr juntas até a saída.
- Rápido, senhoritas! – Silvia gritou.
Em questão de segundos, os guardas se alinharam nas janelas e começaram a atirar. Os estalos ecoavam em meus ouvidos enquanto fugíamos. Não importava mais se as armas usadas pelos rebeldes eram revólveres ou pedras: qualquer um que demonstrasse o menor grau de agressividade nos arredores do palácio iria morrer. Já não havia tolerância com esse tipo de ataque.
- Odeio correr com esses sapatos – Kriss murmurou, com um pedaço do vestido enrolado no braço e os olhos fixos no fim do corredor.
- Uma de nós terá que se acostumar com isso – Celeste comentou, respirando com dificulade.
Suspirei.
- Se for eu, vou usar tênis todo dia. Não aguento mais isso.
- Conversem menos e corram mais! – Silvia gritou.
- Como podemos chegar ao andar de baixo por aqui? – Elise perguntou.
- E Maxon? – Kriss sussurrou.
Silvia não respondeu. Nós a seguimos por um labirinto de corredores em busca de um caminho para o porão, enquanto guardas e mais guardas corriam no sentido oposto ao nosso. Senti muita admiração por eles, imaginando a coragem necessária para ir de encontro ao perigo para proteger outras pessoas.
Os guardas que passavam por nós eram quase todos iguais, mas os olhos verdes de um deles estavam fixos em mim. Aspen não parecia estar com medo, nem sequer preocupado. Havia um problema, e ele iria resolvê-lo. Era o jeito dele.
Nosso olhar foi breve, mas suficiente. As coisas funcionavam assim com Aspen. Em frações de segundo, pude dizer a ele, em silêncio: Tenha cuidado e fique atento. E, sem uma palavra, ele respondeu: Pode deixar, apenas se cuide.
Apesar de lidar bem com essas coisas que não precisavam ser ditas, eu não tinha a mesma facilidade quando conversávamos de fato. Nossa última conversa não tinha sida das mais felizes. Eu estava prestes a deixar o palácio e tinha pedido a ele um tempo para superar a Seleção. Mas, no fim, acabei ficando e não lhe dei qualquer explicação.
Talvez sua paciência comigo estivesse se esgotando; talvez ele já não conseguisse ver apenas o que eu tinha de melhor. Eu precisava resolver essa situação de algum jeito. Não podia imagina minha vida sem Aspen. Mesmo naquele momento, em que eu esperava ser escolhida por Maxon, um mundo sem Aspen parecia inconcebível.
- Aqui está! – Silvia exclamou, empurrando uma tábua misteriosa na parede.
Seguimos escada abaixo, com Elise e Silvia à frente.
- Caramba, Elise, dá para ir mais rápido? – Celeste gritou.
Queria muito ter ficado irritada com ela por ter dito aquilo, mas sabia que todas estávamos pensando a mesma coisa.
À medida que descíamos pela escuridão, tentava me preparar para as horas que desperdiçaríamos, escondidas como ratos. Continuamos a correr. O som da nossa fuga abafava os gritos, até que uma voz masculina ecoou acima de nós.
- Parem! – ordenou.
Kriss e eu viramos ao mesmo tempo e enxergamos o uniforme claramente.
- Esperem! É um guarda – ela disse para as outras.
Paramos onde estávamos, resfolegando. Finalmente ele nos alcançou, também quase sem fôlego.
- Perdão, senhoritas. Os rebeldes fugiram assim que atiramos. Acho que não estavam a fim de briga hoje.
Silvia, alisando o vestido com as mãos, falou por nós:
- O rei concorda que é seguro? Se não for, você estará pondo a vida destas garotas em risco.
- O chefe da guarda liberou. Tenho certeza de que Sua Majestade...
- Não fale pelo rei. Venham, senhoritas, continuem.
- Você está falando sério? – perguntei. – Vamos descer para nada.
Silvia me encarou de um jeito que faria até um rebelde tremer de medo, e achei melhor ficar quieta. Silvia e eu tínhamos construído uma espécie de amizade quando ela, sem saber, me ajudou a tirar Maxon e Aspen da cabeça com suas aulas particulares. Porém, depois meu showzinho no Jornal Oficial, alguns dias antes, nossa amizade parecia ter ido por água abaixo. Voltando-se para o guarda, ela continuou:
- Consiga uma ordem oficial do rei e voltaremos. Continuem andando, senhoritas.
Eu e o guarda trocamos um olhar de frustração e seguimos por caminhos opostos.
Silvia não demonstrou qualquer remorso quando, vinte minutos mais tarde, outro guarda veio avisar que estávamos livres para voltar ao andar de cima.
Estava tão nervosa com aquela situação que nem esperei Silvia e as outras garotas. Subi as escadas até o primeiro andar e segui direto para o meu quarto, ainda levando os sapatos pendurados nos dedos. Minhas criadas não estavam, mas havia uma bandejinha de prata com um envelope sobre a cama.
Na hora reconheci a caligrafia de May. Abri a carta e devorei sua palavras:

Ames,
Somos tias! Astra é maravilhosa. Queria que você estivesse aqui para conhecê-la pessoalmente, mas sabemos que você precisa ficar no palácio por enquanto. Você acha que passaremos o Natal juntas? Está chegando! Preciso voltar para ajudar Kenna e James. Ela é tão bonita que nem dá para acreditar! Aqui vai uma foto!
Amamos você!
May

Puxei a foto brilhante de trás da carta. Estavam todos lá, menos Kota e eu. James, o marido de Kenna, estava radiante, em pé atrás da esposa e da filha, com os olhos inchados. Kenna estava sentada na cama, com um embrulinho rosa entre os braços, parecendo ao mesmo tempo emocionada e exausta. Meus pais irradiavam orgulho, e o estusiasmo de May e Gerad saltava da foto. Claro que Kota não aparecia; ele não ganharia nada estando presente. Mas eu deveria estar lá.
Só que não estava.
Estava no palácio. E, as vezes, nem sabia por quê. Maxon ainda passava muito tempo com Kriss, mesmo depois de tudo que tinha feito para eu ficar. Do lado de fora, os rebeldes atacavam sem descanso; ali dentro, as palavras frias do rei destruíram minha confiança. Em meio a tudo isso, Aspen ainda me rodeava – um segredo que eu precisava guardar. E as câmeras iam e vinham, roubando pedaços de nossas vidas para entreter as pessoas. Eu estava encurralada por todos os lados, perdendo tudo o que sempre fora importante para mim.
Engoli minhas lágrimas de raiva. Estava cansada de chorar.
Em vez disso, comecei a elaborar um plano. A única maneira de resolver esses problemas era acabar com a Seleção.
Embora de vez em quando ainda questionasse minha vontade de ser princesa, eu não tinha dúvidas de que queria ficar com Maxon. Para isso acontecer, não podia simplesmente cruzar os braços e esperar. Enquanto lembrava da minha última conversa com o rei, comecei a andar em círculos, esperando as criadas.
Eu mal consegui respirar, então sabia que tentar comer seria uma perda de tempo. Mas valeria o sacrifício. Precisava fazer algum progresso – e rápido. De acordo com o rei, as outras garotas estavam mais próximas de Maxon – fisicamente falando -, e ele tinha dito que eu era muito comum para ganhar delas naquele quesito.
Como se minha relação com Maxon já não fosse complicada o bastante, ainda precisava reconquistar sua confiança. E eu não sabia se isso significava fazer perguntas ou não. Apesar de ter quase certeza de que a intimidade com as outras garotas não tinha ido tão longe, não conseguia parar de pensar no assunto. Nunca tinha tentado ser sedutora – praticamente todos os momentos íntimos que tivera com Maxon não foram intencionais -, mas eu esperava que, se fosse mais direta, poderia deixar claro que estava tão interessada nele quanto as outras.
Respirei fundo, ergui a cabeça e entrei na sala de jantar. Cheguei um ou dois minutos atrasada de propósito, na esperança de que todos já estivessem sentados. Meus cálculos deram certo. Mas a reação foi ainda melhor do que eu imaginava.
Fiz a reverência cruzando um perna na frente da outra, para que a fenda do vestido se abrisse e revelasse até minha coxa. O vestido era vermelho-escuro, tomara que caia, e deixava as costas totalmente expostas. Tinha certeza de que as criadas tinham feito alguma mágica para que ele parasse no lugar. Me endireitei, olhando fixamente para Maxon. Percebi que ele tinha parado de mastigar. Alguém derrubou um garfo.
Baixei os olhos e fui para o meu lugar, ao lado de Kriss.
- Francamente, America... – ela sussurrou.
Inclinei a cabeça na direção dela e perguntei, fingindo não ter entendido:
- O que foi?
Ela pousou os talheres no prato e nos encaramos.
- Você está vulgar.
- E você está com inveja.
Se não acertei na mosca, cheguei muito perto: ela corou um pouco e voltou a comer. Dei umas poucas beliscadas na comida, pois o vestido estava tão apertado que não dava para engolir muita coisa. Quando serviram a sobremesa, resolvi parar de ignorar Maxon, que, como eu esperava, tinha os olhos fixos em mim. Ele imediatamente ergueu a mão e mexeu na orelha; discretamente, fiz o mesmo. Dei uma olhada rápida no rei Clarkson, me segurando para não rir. Ele estava irritado – o que também fazia parte do plano – e não podia fazer nada a respeito.
Pedi licença para me retirar antes de todo mundo, dando a Maxon a chance de admirar a parte de trás do vestido. Corri para o quarto. Mal fechei a porta e tratei logo de abrir o zíper. Estava desesperada para respirar.
- Como foi? – Mary perguntou, se apressando para me ajudar.
- Ele ficou embasbacado. Todo mundo ficou.
Lucy soltou um gritinho e Anne se apressou para ajudar Mary.
- Vamos segurar o vestido. Apenas ande – foi sua ordem e obedeci – Ele vem esta noite?
- Sim. Não sei bem a que horas, mas com certeza vai aparecer.
Sentei na beirada da cama, com os braços cruzados na barriga para que o vestido aberto não caísse.
Anne fez uma cara triste.
- É uma pena que a senhorita tenha de sofrer por mais algumas horas. Mas estou certa de que valerá a pena.
Sorri, tentanto dar a impressão de que não me importava com a dor. Tinha dito a elas que queria chamar a atenção de Maxon, mas não mencionara minha esperança de que, com um pouco de sorte, o vestido logo estaria jogado no chão.
- Quer que a gente fique até ele chegar? – Lucy perguntou, entusiasmada.
- Não, só me ajudem a fechar isto aqui de novo. Preciso pensar sobre algumas coisas – respondi, levantando para que elas pudessem me ajudar.
Mary segurou o fecho.
- Prenda a respiração, senhorita.
Obedeci, e mais uma vez fui espremida pelo vestido. Pensei em um soldado que se preparava para a guerra. A armadura era diferente, mas a ideia, a mesma.
Naquela noite, eu ia derrotar um homem. 

Capítulo 2

ABRI AS PORTAS DA SACADA e deixei o ar entrar no quarto. Embora fosse dezembro, uma brisa leve fazia cécegas na minha pele. Não tínhamos mais permissão para ficar do lado de fora sem a presença de guardas, então a sacada teria de servir.
Andei pelo quarto e acendi algumas velas, na tentativa de tornar o espaço mais aconchegante. Quando ouvi uma batida na porta, apaguei o fósforo, peguei um livro, voei para a cama e ajeitei o vestido. Ora, Maxon, é assim que eu fico quando estou lendo alguma coisa.
- Entre – convidei, com uma voz que mal dava para escutar.
Maxon entrou. Levantei a cabeça graciosamente e percebi que ele ficou maravilhado ao encontrar o quarto à meia-luz. Então focou sua atenção em mim, correndo os olhos pela minha perna à mostra.
- Aí está você – eu disse, fechando o livro e me levantando para cumprimentá-lo.
Ele fechou a porta e avançou, o olhar cravado nas minhas curvas.
- Queria dizer que você está maravilhosa esta noite.
Joguei o cabelo para trás.
- Ah, por causa deste vestido? Estava escondido no fundo do armário.
- Fico feliz que tenha tirado de lá.
Enlacei meus dedos nos dele.
- Sente-se aqui comigo. Não tenho visto você com muita frequência ultimamente.
Ele soltou um suspiro e me acompanhou.
- Sinto muito por isso. As coisas ficaram um pouco tensas depois das baixas que tivemos naquele ataque, e você sabe como é o meu pai. Enviamos vários guardas para proteger as famílias de vocês, o que diminuiu nossas forças, então ele está pior do que nunca. E também está me pressionando para que eu termine a Seleção, mas continuo firma. Quero ter tempo para pensar bem sobre as coisas.
Fomos até a cama e nos sentamos na beirada, bem perto um do outro.
- Claro. Quem deve controlar isso é você – comentei.
Ele concordou com a cabeça.
- Exatamente. Sei que já disse isso mil vezes, mas fico louco quando as pessoas me pressionam.
- Eu sei – confirmei, fazendo uma cara triste.
Ele fez uma pausa, e não consegui interpretar sua expressão. Tentava pensar num jeito de avançar sem parecer oferecida, mas não sabia exatamente como criar um momento romântico.
- Sei que é uma coisa boba, mas minhas criadas escolheram um perfume novo hoje. É muito forte? – perguntei, aproximando meu pescoço para que ele pudesse sentir.
Ele aproximou o rosto, seu nariz tocando minha pele.
- Não, querida. É ótimo – Maxon respondeu, com a cabeça entre meu ombro e meu pescoço, onde, então, me beijou.
Engoli em seco, tentando me concentrar. Precisava manter um mínimo de controle.
- Que bom que gostou. Estava com saudade.
Senti sua mão se esgueirar pelas minhas costas e baixei o rosto. Ali estava ele, os olhos cravados nos meus, nossos lábios serados por poucos milímetros.
- Quanta saudade você sentiu? – ele sussurrou.
Aquele olhar, somado ao sussurro, fazia meu coração bater depressa.
- Muita – respondi, também sussurrando. – Muita mesmo.
Inclinei o corpo para frente, morrendo de vontade de beijá-lo. Maxon estava confiante. Ele me puxava para mais perto com sua mão e acariciava meus cabelos com a outra. Meu corpo queria se desfazer em um beijo, mas o vestido me impedia. De repente, fiquei nervosa de novo, lembrando do meu plano.
Escorreguei as mãos pelos braços de Maxon e conduzi seus dedos até o fecho do vestido, na esperança de que isso bastasse.
Suas mãos se detiveram ali por alguns instantes. Eu estava a ponto de simplesmente pedir que Maxon baixasse o zíper quando ele caiu na gargalhada.
Sua risada me fez voltar à realidade imediatamente.
- O que é tão engraçado? – perguntei, horrorizada, tentando pensar em um jeito discreto de sentir meu hálito.
- De todas as coisas que você já fez, essa foi de longe a mais divertida! – Maxon exclamou, rindo tanto que dava tapas no joelho.
- Como é?
Ele estalou um beijo na minha testa e disse:
- Sempre imaginei como seria quando você tentasse. – E voltou a gargalhar. – Desculpe, preciso ir – completou. Até seu jeito de levantar dava mostras de que estava se divertindo muito. – Vejo você amanhã.
E saiu. Simplesmente saiu!
Fiquei lá, sentada, completamente arrasada. Onde eu estava com a cabeça quando pensei que aquilo daria certo? Maxon podia não saber tudo sobre mim, mas pelo menos conhecia meu caráter. E aquela... aquela não era eu.
Baixei os olhos para aquele vestido ridículo. Era demais. Nem Celeste teria ido tão longe. Meu cabelo estava perfeito demais; minha maquiagem, carregada demais. Ele tinha entendido minhas intenções desde o primeiro segundo em que pôs os pés no quarto. Suspirando, apaguei as velas uma por uma e fiquei imaginando como iria encará-lo no dia seguinte.



Capítulo 3

PENSEI EM FINGIR UMA GASTRITE. Ou uma enxaqueca arrasadora. Ataque de pânico. Sério, qualquer coisa que me livrasse do café da manhã.
Então pensei em Maxon e no que ele sempre dizia sobre encarar as dificuldades com a cabeça erguida. Talvez não fosse meu ponto forte, mas se ao menos eu descesse até a sala de jantar, ao menos estivesse presente... quem sabe ele me daria algum crédito.
Na esperança de consertar pelo menos parte do que fizera, pedi às criadas que me vestissem com a roupa mais discreta que eu tivesse. Só por esse pedido elas entenderam que não deviam perguntar nada sobre a noite anterior. O decote do vestido era um pouco mais fechado do que costumávamos usar no clima quente de Angeles, e as mangas chegavam quase até o cotovelo. Era florido e alegue, o oposto do visual da noite anterior.
Mal conseguia olhar para Maxon quando entrei na sala de jantar, mas pelo menos mantive a postura ereta.
Quando finalmente dei uma espiada em sua direção, lá estava ele me observando, com um sorriso irônico nos lábios. Enquanto  comia, Maxon piscou para mim, e voltei a baixar a cabeça, fingindo estar muito interessada na minha quiche.
- Bom ver você com roupas de verdade hoje – Kriss disparou.
- Bom ver você de bom humor.
- O que deu na sua cabeça? – ela perguntou.
Desanimada, não quis prolongar a conversa.
- Estou sem paciência oara isso hoje, Kriss. Só quero que você me deixe em paz.
Por um instante, achei que ela fosse reagir, mas aparentemente eu não valia o esforço. Ela se ajeitou na cadeira e continuou a comer. Se eu tivesse obtido um mínimo de sucesso na noite anterior, poderia justificar minhas ações. Mas do jeito que as coisas tinham ido, sequer podia fingir orgulho.
Arrisquei outro olhar para Maxon. Apesar de não estar mais me observando, dava para perceber que ainda se segurava para não rir enquanto cortava a comida. Era demais. Eu não suportaria um dia inteiro daquele jeito. Já estava me preparando para desmaiar, fingir uma dor de barriga ou tentar qualquer coisa para sair dali o mais rápido possível quando um mordomo entrou na sala. Trazia um envelope em uma bandeja de prata e fez uma reverência antes de colocá-la diante do rei Clarkson.
O reie pegou a carta e leu-a no ato.
- Malditos franceses! – resmungou. – Desculpe, Amberly, mas parece que terei de partir dentro de uma hora.
- Mais um problema com o tratado de comércio? – a rainha perguntou tranquilamente.
- Sim. Pensei que tivéssemos acertado tudo meses atrás. Precisamos ser firmes desta vez.
O rei atirou o guardanapo na mesa, levantou e seguiu  em direção à porta.
- Pai! – Maxon chamou, também se levantando. – Não quer que eu vá junto?
De fato, eu tinha achado estranho o rei não vociferar nenhuma ordem para que o filho o seguisse quando se levantou. Afinal, era esse o seu método de ensino. Desta vez, porém, ele se voltou para Maxon e, com o olhar frio e a voz cortante, disparou:
- Quando você estiver pronto para se comportar como um rei, poderá vivenciar o que um rei faz. – E se retirou, sem dizer mais nada.
Maxon permaneceu de pé por alguns instantes, chocado e envergonhado pela bronca que levara na frente de todo mundo. Sentou novamente e se dirigiu à mãe:
- Para ser sincero, não estava muito animado com o voo – comentou, para aliviar a tensão com uma piada. A rainha sorriu, como obviamente era sua obrigação, e nós ignoramos o ocorrido.
As outras garotas terminaram o café da manhã e pediram licença para ir ao Salão da Mulheres. Quando restávamos apenas Maxon, Elise e eu, levantei os olhos para ele. Mexemos na orelha ao mesmo tempo e sorrimos. Elise finalmente saiu, e nos encontramos no meio da sala de jantar, sem nos importarmos com as criadas e os mordomos que chegavam para limpar a mesa.
- Ele não vai levar você por minha causa – lamentei.
- Talvez – Maxon provocou. – Acredite, não é a primeira vez que ele tenta me colocar no meu lugar, e, na cabeça dele, tem milhares de motivos para isso. Não me surpreenderia se o principal motivo agora fosse despeito. Ele não quer deixar o poder, mas quanto mais perto eu chego de escolher uma esposa, maior a probabilidade de que isso aconteça. Apesar de ambos sabermos que ele nunca abrirá mão do governo.
- Você deveria me mandar para casa de uma vez. Ele nunca vau deixar que me escolha.
Eu ainda não contara a ele que seu pai havia me encurralado e me ameaçado no meio do corredor deposi que Maxon o convencera a me deixar ficar. O rei Clarkson deixara bem claro que era para eu ficar de boca fechada sobre aquela conversa, e eu não pretendia contrariá-lo. Ao mesmo tempo, odiava guardar segredos de Maxon.
- Além disso – acrescentei, cruzando os braços -, depois de ontem à noite, não acho que você me queira por aqui mesmo.
Ele mordeu os lábios.
- Desculpe pela minha reação, mas, sério, o que mais eu podia fazer?
- Eu tinha várias ideias – murmurei, ainda envergonhada por ter tentado seduzi-lo. – Agora me sinto uma idiota – completei, escondendo o rosto entre as mãos.
- Pare com isso – ele disse gentilmente e me abraçou. – Acredite, foi muito tentador, mas você não é assim.
- Mas não deveria ser? Isso não deveria fazer parte do que somos? – lamentei, apoiando a cabeça em seu peito.
- Você não se lembra da noite no abrigo? – Maxon perguntou baixinho.
- Sim, mas aquilo era basicamente a nossa despedida.
- Teria sido uma despedida fantástica.
Recuei, dando um leve empurrão nele. Ele achou graça, feliz por ter amenizado o desconforto da situação.
- Vamos esquecer esse assunto – propus.
- Ótimo – concordou. – Além do mais, temos um projeto para pôr em prática, você e eu.
- Temos?
- Temos. Como meu pai está fora, este é o momento ideal para começarmos a bolar estratégias.
- Certo – eu disse, empolgada por fazer parte de algo só entre nós dois.
Maxon respirou fundo, me deixando ansiosa para descobrir o que estav tramando.
- Você tem razão. Meu pai não a aprova. Mas ele pode ser obrigado a ceder se conseguirmos uma coisa.
- Que coisa?
- Precisamos fazer de você a favorita do povo.
Fiz uma careta.
- Esse é o nosso projeto, Maxon? Nunca vai acontecer. Vi uma pesquisa em uma das revistas da Celeste depois que tentei salvar Marlee. As pessoas não me suportam,
- As opiniões mudam. Não deixe um momento isolado desanimá-la.
Eu ainda achava que era impossível, mas o que poderia dizer? Se aquela era a minha única opção, pelo menos deveria tentar.
- Tudo bem – eu disse. – Mas já vou avisando que não vai funcionar.
Com um sorriso travesso no rosto, Maxon chegou bem perto e me deu um beijo longo e demorado.
- Pois eu digo que vai.

Continua ...

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